Se as dívidas de uma empresa impactam nas suas decisões de gestão ou de investimento, esse artigo é pra você.

 

As dívidas podem ser a salvação de uma empresa, afinal ganhar dinheiro é bom, ganhar dinheiro usando o dinheiro dos outros é melhor ainda, mas também podem ser sua destruição, quem não lembra dos recentes casos da PDG e da OI, que de tão endividadas tiveram que pedir recuperação judicial?

Ao analisarmos as dívidas de uma empresa, o fazemos com dois objetivos:

  1. Analisar se aquelas dívidas estão ajudando a empresa a aumentar seu lucro, conhecida como Análise da Alavancagem Financeira; e/ou
  2. Analisar a capacidade de a empresa pagar suas dívidas, conhecida como “Análise do Endividamento”.

Hoje nós abordaremos a Análise do Endividamento, mais precisamente, um erro comum cometido ao analisar as dívidas de uma empresa.

Conceitos que abordaremos neste artigo

Antes de abordarmos o erro em questão vamos simplificar 5 conceitos que veremos nesse artigo:

Dívidas Onerosas: São aquelas que geram juros ou correção monetária. Por exemplo, os empréstimos bancários. São essas as dívidas que abordaremos neste artigo.

EBITDA: Indicador que representa o resultado de uma empresa antes de deduzidos o resultado financeiro, os tributos sobre lucro e os custos e despesas com depreciação, amortização e exaustão. É bastante utilizado para estimar o potencial de geração de caixa operacional de uma empresa.

Covenants: São cláusulas contratuais que devem ser cumpridas por uma empresa para evitar, principalmente, a obrigação de pagamento antecipado de uma dívida.

Debênture: Título de dívida emitido por sociedade anônima que configura um empréstimo realizado pelo portador do título à empresa.

Disponível: É a soma do total do Caixa, das Contas Bancárias, das Aplicações Financeiras e dos Títulos Financeiros de uma empresa.

Por que este erro se tornou tão comum?

Existe um indicador extremamente popular que é utilizado para calcular quanto tempo a empresa demoraria para pagar suas dívidas onerosas utilizando o seu Disponível e o seu EBITDA. Esse indicador é chamado de “Dívida Líquida sobre o EBITDA (DLE) ” e ele é calculado pela seguinte fórmula:

Dívida Líquida sobre EBITDA, Indicadores de endividamento, índices de endividamento, índice de alavancagem, alavancagem financeira

Onde:
DLE: Dívida Líquida sobre EBITDA.
DO: Dívidas Onerosas
Disp: Disponível
EBITDA: EBITDA. É recomendado a utilização do EBITDA ajustado, mas para não complicarmos as coisas, vamos usar o EBITDA normal.

Por exemplo, se ao final do ano de 2018 a DLE de uma empresa foi igual a 4, isso significa que, mantendo o seu EBITDA atual, a empresa levaria 4 anos para pagar suas dívidas. Se essas dívidas vencerem em mais de 4 anos isso é um resultado excelente, mas se essas dívidas vencerem em menos de 4 anos isso pode ser preocupante, ou seja, quanto menor a DLE, maior a capacidade de a empresa pagar suas dívidas e menor o risco de inadimplência.

A DLE é um indicador exigido nos covenants de praticamente todas as grandes dívidas onerosas, por isso, seu cálculo se tornou extremamente popular no mundo todo, porém essa popularização levou ao erro que abordaremos a seguir:

O erro que você deve evitar

Quando falamos de dívidas onerosas logo pensamos em Empréstimos, Financiamentos e Debêntures, essas são normalmente as dívidas que são usadas no cálculo da DLE, porém existe uma dívida que pode representar grande risco à situação financeira da empresa e que é normalmente ignorada no cálculo deste indicador, elas são as Provisões para Processos Judiciais.

As Provisões para Processos Judiciais são os valores decorrentes de processos judiciais que a empresa provavelmente pagará no futuro, ou seja, quando a empresa está enfrentando um processo e ela julga que a chance de perda é provável, ela reconhece os valores do processo como uma dívida no Balanço Patrimonial, corrigindo-os com o passar do tempo.

Existem processos em que é exigido que a empresa deposite judicialmente os valores totais ou parciais da causa, os valores destes Depósitos Judiciais também são corrigidos com o passar do tempo e servem como uma garantia que a empresa terá o dinheiro necessário para pagar o processo em caso de perda.

Como vimos, as Provisões para Processos Judiciais representam dívidas da empresa, sendo corrigidas monetariamente e com riscos de inadimplência assim como qualquer outra dívida onerosa. Também vimos que os Depósitos Judiciais representam garantias de pagamento para estes processos, sendo assim, podemos afirmar que, se os valores dos Depósitos Judiciais não forem superiores aos valores das Provisões para Processos Judiciais será necessário que a empresa utilize o seu Disponível e/ou o seu EBITDA para pagar estes processos.

Ao calcularmos a DLE sem considerarmos os valores de Depósitos Judiciais e de Provisões para Processos Judiciais desconsideramos estes dois fatores que podem trazer riscos à situação financeira da empresa, sendo assim, as fórmulas da DLE deveriam ser as seguintes:

Dívida Líquida sobre EBITDA, Indicadores de endividamento, índices de endividamento, índice de alavancagem, alavancagem financeira, provisão para processos judiciais

Onde:
DLE: Dívida Líquida sobre EBITDA.
DO: Dívidas Onerosas
Disp: Disponível
EBITDA: EBITDA. É recomendado a utilização do EBITDA ajustado, mas para não complicarmos as coisas, vamos usar o EBITDA normal.
PPJ: Provisão para Processos Judiciais
DJ: Depósitos Judiciais

Assim, sempre que os Depósitos Judiciais forem inferiores às Provisões para Processos Judiciais utilizaremos a 2ª fórmula, dessa forma, não corrermos o risco de o resultado da DLE ser divergente da realidade da empresa, o que pode nos levar a tomar decisões erradas de gestão ou de investimento.

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Exemplo Real

Agora vamos a um exemplo real para vermos na prática a diferença no resultado dos dois cálculos:

Vamos utilizar os dados das Demonstrações Contábeis consolidadas de 2016 da CVC Brasil, uma agência de turismo negociada na BOVESPA sob o código CVCB3. Os valores estão apresentados em milhares de reais:

Os dados que utilizaremos foram destacados em vermelho por nós:

Balanço Patrimonial
Balanço Patrimonial, Exemplo Balanço Patrimonial, Balanço patrimonial CVC, CVCB3

DRE

Com as informações já destacadas no Balanço e na DRE, vamos separá-las aqui:

DO = 216.121 (Empréstimos e financiamentos) + 35.274 (Instrumentos financeiros) + 76.912 (Empréstimos e financiamentos) = 328.307
Disp = 55.530 (Caixa e equivalente de caixa)
PPJ = 39.514 (provisão para demandas judicias e administrativas)
DJ = 0
EBITDA = 439.365 (Lucro antes do resultado financeiro) + 60.851 (Depreciação e amortização) = 500.216

Obs: No cálculo do EBITDA, como a Depreciação e amortização estão com o valor negativo, significa que devemos soma-las ao Lucro antes do resultado financeiro

Com as informações separadas, podemos calcular a DLE normal e a DLE com PPJ:

A DLE normal seria calculada da seguinte forma:

Já a DLE com PPJ teria o seguinte cálculo:

Em ambas situações a CVC possuía uma excelente situação financeira ao fim de 2016, sendo capaz de liquidar todas suas dívidas em menos de 1 ano.

Apesar de a diferença entre os resultados não parecer grande à primeira vista, a Provisão para demandas judiciais e administrativas aumentou em quase 13% o tempo necessário para pagamento de todas as dívidas. Esse tipo de diferença pode ser fatal no planejamento de uma empresa ou na análise de um investidor.

Eu recomendo que você sempre utilize esse indicador para análise de endividamento e utilize a DLE normal apenas para analisar se a empresa está em conformidade com os covenants de suas dívidas ou quando os Depósitos Judiciais forem maiores que as Provisão para Processos Judiciais.

Eu considero o endividamento o segundo fator mais importante em uma análise financeira, perdendo apenas para rentabilidade, por ser tão relevante, um erro nesse tipo de análise pode gerar prejuízos financeiros inimagináveis tanto para sua empresa quanto para seus investimentos. Uma das coisas que eu ensino no meu e-book é como evitar esse tipo de erro e outros bem piores, se você quer melhorar as suas análises você pode conhecer mais sobre ele AQUI.

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IMPORTANTE!

As informações utilizadas no exemplo real foram retiradas das Demonstrações Contábeis publicadas pela empresa em questão, tais informações são de inteira responsabilidade da empresa.

As análises apresentadas com base nas informações da empresa utilizada no exemplo real foram realizadas exclusivamente para o melhor entendimento do conteúdo explicado, não representam, portanto, qualquer tipo de recomendação de qualquer título negociado em mercado, atrelado direta ou indiretamente à empresa citada, tampouco representam qualquer recomendação para qualquer parte que possa estar envolvida direta ou indiretamente com essa empresa.

Os critérios, estimativas e julgamentos utilizados refletem aqueles adotados pelo autor do artigo e podem diferir daqueles adotados por outras pessoas ou empresas.

3 Comentários para “Não cometa esse GRANDE ERRO ao analisar as dívidas de uma empresa”

  1. Cleydilaine

    Nossa!

    Vou te que ajustar todas as minhas análises 😀

    Muito obrigado por compartilhar

  2. Carlos Marques

    Olá. Parabéns pelo artigo.

    Esse ponto que você levantou, realmente, é algo que não é muito comentado.

    Eu conheço também o Indicador Dívida Bruta Sobre EBITDA. o que você acha dele?

    1. Thiago Ferreira

      Olá, Carlos. Obrigado pelo seu comentário.
      A Dívida Bruta sobre EBITDA funciona de forma semelhante a Dívida Líquida sobre EBITDA, porém não contempla o “Disponível”, o que é algo que sempre deve ser considerado.
      Um grande abraço

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